Quando o inimigo é útil.

Temos que nos acostumar à ideia de sermos governados por Jair Bolsonaro e sua esplanada. Não adianta, nem mesmo com a suspeita ajuda da Globo a gente vai conseguir evitar que o homem tome posse. Sendo assim, é hora de encontrar ouro minerando num lixão. Deve ter o que se extrair de bom desse governo que vem aí. O Itamar Franco não ficou em cima do muro, mas, pelo menos não cedeu à corrupção? Então?
A extinção do Ministério do Trabalho como conhecemos, por exemplo, ao meu ver pode ser encarado como uma grande vitória para o trabalhador. Parece que não, né? Deixa eu explicar:
Há dois anos, 2016, eu precisei recorrer ao MT por causa dos abusos que eu e os trabalhadores da empresa onde eu trabalhava sofríamos. Eu tive as seguintes experiências:
Primeiro, passei mais de seis meses, de janeiro à agosto, tentando marcar sessão no órgão para solicitar rescisão indireta devido à não cumprimento pelo empregador das obrigações contratuais para comigo. Eu telefonava pro MT e não conseguia ser atendido. Ia ao estabelecimento da instituição e batia com a cara na porta. Uma tabuleta com os dizeres “estamos em greve” era o motivo. Seis ou sete meses de greve. Pode isso? E pra justificar, a grande mídia noticiava que o órgão não estava recebendo verbas do governo.
Com isso, o que aconteceu? Deu-se o perdão ao que eu ia reclamar e eu perdi o direito da rescisão que eu pleiteava.
Uma amiga minha, no mês de março de 2017, havia me solicitado testemunhar na causa dela e eu aceitei. A audiência dela fora marcada na ocasião para o mês de fevereiro do ano seguinte. Ela acionara a Justiça através do sindicato laboral que nos representava.
Em junho de 2017 eu recebi uma intimação para ir depor pra ela, no dia 02 de agosto, num fórum do MT em uma cidade que não tinha nada a ver com ela ou com a empresa com quem ela conflitava. Aliás, o fórum nomeado no Contrato de Trabalho para resolver as pendengas entre o contratante e os contratados era o de Belo Horizonte.
No início de julho recebi outra vez a mesma carta, relembrando a data da audiência e a multa de dez salários mínimos que eu teria que pagar caso não fosse ao compromisso sem apresentar justificativa. O envio da carta voltou a acontecer no final desse mês.
Compareci ao local no dia e hora marcados. Não encontrei minha amiga por lá. Foi porque o início da discussão em juízo se aproximava é que conheci o advogado da moça, que gritou pela testemunha. Então, ele me disse que a cliente dele não iria e justificou a escolha do local como ser um procedimento normal do meio jurídico, que visa priorizar o deslocamento da testemunha.
É claro que refutei. Era mais fácil para mim seguir para Belo Horizonte. E se a reclamante tivesse duas testemunhas que morassem em cidades distintas e opostas a localização, quem seria priorizado?
Além disso, fiquei desconfiado de algumas coisas que o advogado me pediu para falar para o juíz. No processo julgariam uma indução de pedido de demissão sofrido pela reclamante e já existia a informação de que quem a induziu ao fato, estando ela grávida, no momento do acontecimento estava a sós com a autora do processo, trancafiados em uma sala. Informação prestada pela própria vítima. O advogado queria que eu alegasse que presenciei o fato. Detalhe: No dia dessa demissão eu estava de férias.
Lógico que não fui na onda nem mesmo de falar que eu sabia que ela estava grávida na ocasião. Eu não sabia. Fui lá pra falar sobre o caráter do supervisor que a induziu pedir demissão e sobre eu já tê-lo visto praticando com outros colegas o mesmo ato e outros atos inconformes com os direitos dos trabalhadores.
Aproveitei que o advogado era do sindicato e perguntei a respeito de um processo que eu havia iniciado com a instituição. Tirei da mão deles quando descobri que nada haviam feito. Mais tarde descobri que provavelmente à pedido da empresa eles aguardavam o tempo para que prescrevesse minha petição. Com isso, perdi novamente minha oportunidade de me alforriar daquela empresa escravista tendo todos os direitos ganhos.
Porque eu prestei depoimento no processo dessa minha amiga, a empresa passou a me perseguir. Eu me esquivei de todos os seus truques. E dei bastante dor de cabeça para os gestores quando – devidamente – entreguei mais de trinta dias de atestado médico, de maneira a não entrar em afastamento. Aí, como represália, mudaram o horário do meu expediente, começando num turno e indo até o próximo, 18:00.
Isso me atrapalhava bastante, então, recorri à Justiça novamente para pedir rescisão indireta com base no artigo 468 da CLT, que diz que as mudanças no Contrato de Trabalho, que inclui mudança de turno na duração do expediente, só podem acontecer em comum acordo das partes contratantes.
O MT não estava realizando pronto-atendimento. Nem chegando de madrugada no posto para pegar senha para até 20 pessoas por dia, como era antes. Era necessário ligar para o *156 ou acessar o site do órgão. O site sempre fora do ar em uma ou outra coisinha e o telefone difícil de ser atendido. Mas, com muita dificuldade, consegui marcar uma audiência para agendar uma atermação. Tive que aguardar um mês. Seria em janeiro de 2018 o evento.
A Reforma Trabalhista do Michel Temer havia sido promulgada em novembro de 2017. E na sessão, após saber o que eu ia reivindicar, o auditor do MT me deu uma CLT surrada, aberta no artigo 483 e escrito à lápis uma alínea inexistente na versão original. O homem me disse que era complemento vindo da Reforma Trabalhista.
O conteúdo da tal alínea tirava minha razão e ainda me intimidava, pois, dizia que eu teria que pagar todos os custos do processo se eu perdesse. E na cara dura o velho ainda me disse que os juízes estavam comprometidos em não contribuir com o desemprego e não legar despesas com rescisões para as empresas para não lhes aumentar a crise.
Entendi tudo, inclusive o ar de corrupção, e me mandei dali. Ou seja: sem o Ministério do Trabalho estamos desde há muito tempo. E sem representantes sindicais idens. Todos colaboram para que o sistema trabalhista funcione bem para os patrões e todos defendem o seu ganho nesse sistema. Os sindicatos ganham propinas dos patrões para rifarem os trabalhadores a que representam. Fingem representação. Esta é a realidade que mesmo o governo petista colaborava com ela.
Em meados do mês de janeiro eu fui testemunhar para outro colega. E este ganhou a causa. Reverteu uma demissão por justa causa que recebeu. A advogada dele era particular, mas, também teria aceitado propina desse meio obscuro e o meu amigo só conseguiu ver o dinheiro da causa há poucos meses atrás, considerando que estamos em dezembro de 2018. Como ele conseguiu outro emprego, ficou sem receber o Seguro Desemprego – outra coisa que os juízes agiam para o Estado não pagar – que tinha direito e com certeza não verá retroativos.
Em fevereiro, a amiga já mencionada me telefonou. Perguntou se eu estava lembrado da audiência dela. Eu fiquei pasmo de ela não saber nada sobre a sessão de agosto. E ainda me dizer que teve seu bebê no dia seguinte do provavelmente falso julgamento preparado para lhe queimar meu testemunho e lhe legar a perda da causa.
Se ela não tivesse ficado chateada comigo, achando que eu mentia, não tendo me dado sequer meios de mostrar a ela as intimações de presença que recebi e a cópia da declaração de comparecimento que tive que levar na empresa para ter abonadas as horas gastas no ensejo, eu processaria junto com ela o sindicato, a empresa e até o MT. Todos evidentemente estavam concubinados nesse esquema de lesar trabalhador.
Um tempo depois, uma junta do Ministério do Trabalho esteve na empresa para fazer inspeção. Isso aconteceu depois de uma paralisação de dois dias que os funcionários fizeram guiados pelo sindicato. A greve foi motivada por causa de obrigações salariais que a empresa não estava cumprindo havia cinco meses.
A maioria dos trabalhadores não percebeu, mas, houve um golpe de lide simulada que junto com a empresa o sindicato aplicou nos trabalhadores. Fingindo ajudar os operários, o sindicato buscava filiação, já que Michel Temer havia cortado a contribuição sindical de ser obrigatória ao trabalhador.
Esse episódio foi um tiro no pé para o sindicato, mas, legou à empresa o direito de mandar vários funcionários embora sob alegação de justa causa. Era parte do plano. Ela precisava disso, pois, pensava em reduzir o quadro e queria evitar pagar rescisões com todos os direitos. Os que não foram demitidos assim, pediram conta. Também interessava aos patrões.
Fiz denúncias no site do Ministério do Trabalho e também no da Polícia Federal, convocando esta ao estouro de cativeiro de trabalho escravo e crime de formação de quadrilha. Achei que a visita da junta do MT fosse movida por essas denúncias.
Porém, o que os inspetores do MT fizeram foi uma espécie de tomada de providência para inglês ver. Com ar de visita surpresa, não fizeram mais do que avaliar coisas que certamente a empresa andaria na linha com elas. Tipo: se o ar condicionado estava na temperatura adequada. Para fazer que olhavam também questões morais, pediram aos gerentes para escolherem operadores para eles entrevistarem.
Até fizeram perguntas importantes para os escolhidos, mas, quando todos os operadores esperavam de eles fornecerem respostas que ajudariam a acabar com as injustiças e as fraudes contra o trabalhador, todos se viram frustrados com as que deram os colaboradores escolhidos a dedo. Gente que foi premiada com folga de dois dias após a prestação de favor devido pelas suas respostas. Gente que em seguida foi promovida. Entende?
Outra colega entrou em depressão grave naquele cativeiro. Conseguiu afastamento de cinco meses. Foi obrigada a voltar antes do prazo, pois, não recebeu um centavo sequer do INSS. E a empresa não quis colaborar nem um pouco com ela, pelo menos a trocando de função por uns tempos. Era o cerco ao trabalhador. Melhor ser liberal e não depender do Estado para nada.
Esse tipo de coisa é fruto de uma política velha existente no Brasil. A Reforma Trabalhista iniciou o rompimento com esta política e o que Paulo Guedes já anunciou fazer em seu ministério da economia e do trabalho no Governo Bolsonaro é de extrema importância para moralizar empregadores, juristas, sindicatos e combater o trabalho escravo que este sistema dá permissão para se configurar.
Não só o que ele vem anunciando com respeito ao trabalho, mas, também com respeito à economia mexe diretamente nesse bolo. Essas tentativas de minar a moral do presidente eleito visam impedir elevar esse cerco à outras forças sociais. Querem é continuar com esse negócio de que é só o trabalhador quem paga o pato. Por certo, há a mão de empresários, nacionais e estrangeiros, por trás desses casos que a mídia, fingindo agradar o público, noticia. E, é claro, servidores públicos, como os do MT, que não querem largar as mamatas e querem continuar com a garantia de emprego vitalício. Neoliberalismo tem horror a funcionário público, incluindo político. Por isso, tem político também nesse grupo.
Só que essas investidas só atingem Jair Bolsonaro, considerando que os filhos dele são uns ninguém no escrete que se dirige para a presidência. Se forem elas suficientes para fazer cair o presidente eleito, ele cairá sozinho. Seu vice assumirá e os ministros tocarão os planos já traçados. De liberar a economia, mas, também liberar o trabalhador. Chegou a hora de admitirmos isso e parar com as picuinhas ou de deixar de ser ingênuo aquele que não consegue enxergar que na verdade aquilo que Getúlio Vargas implantou era bom para aquela época ou, atualmente, para países que empregam o socialismo na íntegra.
Se há alguma chance de impedir de tentarem acabar com a política escravista que abrange o trabalho no Brasil, com a frágil economia que depende de que empresas sem utilidade existam só para empregar, pagando com muito sofrimento o salário mínimo aos funcionários, evitando o máximo de eles alcançarem remuneração variável, o que resume a modalidade à cativeiro de trabalho escravo, e com as oportunidades de corrupção estando o país envolto de empresas e faculdades públicas, transporte público, sistema de saúde pública e políticos safados que administram essas entidades, esta chance reside em deixar Jair Bolsonaro em paz e empossar de vez.
Sem ele no posto, o país caminhará para o parlamentarismo que Temer tanto gostaria de implantar e o que hoje é conhecido como presidente da república passaria a ser chamado de primeiro ministro, que fatalmente seria o do ministério mais importante de cada governo, que no novo será o da economia e do trabalho.
Este texto foi compilado reunindo histórias de terceiros, mesmo a parte contada em primeira pessoa. Antes de me tacar pedra, reflita: Se quisermos continuar com a política socialista que desde de Getúlio Vargas 1930 temos aplicado ao trabalho, então, temos que brigar para que o país seja socialista em todos os setores. Do contrário, o trabalhador vai continuar recebendo chicotada do patrão. E o consumidor sendo enganado pelos trabalhadores, que recebem chicotadas exatamente para isso. Discorro em outra postagem esta parte do assunto.