Sendo dono do próprio destino

Como as pessoas te tratam é o karma delas; como você reage é o seu
(Trulshik Rinpoche)
O provérbio tibetano atribuído ao dalai lama Kyabje Trulshik Rinpoche nos ajuda a lidar com a lei da ação e reação. O bater de asas de uma borboleta na América do Sul pode provocar um terremoto no Japão. Logo, a borboleta tem que meticular seus movimentos, pois, ela pode determinar o destino de muita gente de olho puxado lá no Oriente.

Amor evitado nas novelas

crisantemos-de-colores

Voltava eu do trabalho em companhia de uma loirinha, cabelo curto bem reluzente, olhos azuis. Corpuda. Mais baixa pouca coisa a mais do que eu. Vestia calça jeans e blusa branca de botão. Abraçava a bolsa tiracolo. Me vi na companhia dela desde as escadas da Galeria Ouvidor, rumando para a rua São Paulo. Havíamos entrado na galeria para ela comprar alguma coisa. Quando atravessamos a porta da galeria para atravessar a São Paulo rumo à Praça 7, ela viu de longe, na calçada da Avenida Amazonas, uma morena de vestido azul e cabelos longos soltos. Acenou para ela a cumprimentando à distância. Daí ela me disse que aquela era uma amiga dela. E fez a ela um enaltecimento exibindo um semblante de satisfação em tê-la visto, como se isso a tivesse submetido a lembranças efêmeras.

Eu deduzi então que fossem ou tivessem sido elas companheiras um dia. Ela respondeu assim: “Como dizem na novela: a gente era feliz sem importar se a gente é homem ou se a gente é mulher”. E em seguida quis saber minha opinião a respeito.

Eu disse pra ela que precisaríamos sentar para eu dar a minha opinião completa. Ela entendeu o convite. Tinha tempo, então, paramos num dos bares no final da Av. Amazonas. Seguíamos em direção à estação central do metrô.

Eu estava sentindo uma atração por ela havia um tempo. Então, larguei da morosidade de sempre e fui logo viabilizando a cantada. Eu sabia que a situação era um pouco ruim por causa do relato dela, mas eu não tinha dúvida de que ela jogasse nos dois times.

Eu disse para ela que eu achava que as pessoas deviam chegar à conclusão de que é ou está sendo feliz por elas próprias. Sem depender do que ensina a dizer ou a pensar, por exemplo, uma novela. Nem sempre, a gente determinar que está sendo feliz tem a ver com gênero sexual. Se você está se sentindo bem em um maravilhoso carro que você conseguiu comprar, no que essa felicidade ou esse momento feliz depende de você ser homem ou mulher?

Disparando o que se passava em minha mente eu fui mais longe.

Veja, eu sinto uma atração enorme por você. E eu sinto isso quando olho para esses seus olhos azuis e esse seu jeito simples de ser, de me aceitar como um amigo. Tanto seus olhos, quanto esse seu jeito, poderiam pertencer a um homem. Portanto, para eu sentir essa atração por você independe de você ser uma mulher e eu um homem.

E você me deu essa oportunidade de sentar a só com você para discutirmos um assunto que facilita eu dizer isso. Você é pelo menos trinta anos mais nova do que eu. No entanto, pode ceder ao meu assédio e isso não fará a menor diferença para você. Ambos estaremos pensando no que estamos vivendo, se está sendo bom.

Se eu fosse me orientar pelo que diz a novela, eu nem arriscaria a dizer o que estou dizendo, pois, a novela ensina, como padrão, que os amantes devem regular na idade, na cor, na religião, na cultura, na condição financeira. Só dizem coisas diferente disso, só incentivam relações mais díspares ante a esses preconceitos, se algum patrocinador estiver com a intenção de patrocinar determinado tipo de casal e investiu na novela para fazer a engenharia social de aceitação.

Da mesma forma fazem com a sexualidade. E por não haver naturalidade no comportamento das pessoas que se submetem à telenovela e copiam o que veem nela, acabam por experimentar infelicidade, pois, haverá um tempo em que o transe passará. Principalmente quando outra novela aparecer, outro assunto passar a ser discutido e o anterior deixado de lado, se não houver quem se interesse que seja mantido em evidência.

A loirinha se embriagou com o mix de emoção que ela experimentou. Surpresa, admiração, porre de conscientização, vaidade por receber elogios, tesão. E eu não quis perder tempo e nem correr o risco de deixar escapar um flerte por falta de ação. Nada de deixar nenhum dos ânimos esfriar. Era visível que era ela naquele momento uma presa fácil. Toquei-lhe, com carinho, o braço direito na altura do ombro. Ao certificar que ela não fez objeção, trouxe ela pra mim. Foi assim que começou esse namoro do tipo que excluem nas novelas: amor sincero.

Adaptado de um capítulo do livro “Contos de Verão: A casa da fantasia“, que expõe alternativas de desenvolvimento de relacionamentos.

Não era a hora

Uma coisa que quem pretende se tornar um conquistador ágil tem que saber é leitura fria. Interpretar gestos, expressões faciais e posturas com que as pessoas se comportam. E uma pessoa de pé em uma estação de ônibus, olhando, abraçada bem firme à bolsa, para o ponto onde o mesmo pára e as portas se abrem para os passageiros, não está exatamente em um momento propício para receber um flerte. O foco dela está em seu interesse absoluto. E ainda existe sua individualidade para tratar.

Ele olhou para a loira de lábios grossos mordiscantes e com o cabelo escorrendo no rosto cobrindo um dos olhos e a achou estupenda. Sinalizou seu íntimo caçador de conquistas: “eis uma chance”. Tudo que ele tinha que fazer era promover mudanças no aspecto dela. Se ele conseguisse fazer isso ele baixaria a guarda dela. Teria que usar seus truques de influência à distância.

Ele percorreu com os olhos atrás do anel dedo duro na mão esquerda dela, pois, aparentemente Loira Lábios Grossos parecia casada. Ele não encontrou entre os tantos anéis que ela usava o que poderia ser uma aliança de casamento, mas a impressão continuou valendo. Sua intuição é que lhe estava dizendo. Outra coisa que conquistadores precisam desenvolver é comunicação excelente com o seu eu interior, que é o seu cavalo.

Bem, você sabe, o lema do conquistador é “o tempo voa, amor”. E a maior perda e a única que o conquistador lamenta é a perda de tempo. Não que devemos agir inconsequentemente e invadir território dos outros. Se ele viesse a constatar mesmo o laço matrimonial na vida dela expresso de alguma forma indubitável, sua caçada pararia por ali.

E o ônibus chegou na estação e abriram-se as portas. Ficou sabido então que esperavam a mesma linha. Ela entrou primeiro. Ele a seguiu. Não havia chances para sentar. Ele ficou ao lado dela. Perto da orelha esquerda dela. E armou o bote.

A estratégia era usar a telepatia. Influenciá-la a ter pensamentos que a fizesse imaginar que ele tentava uma aproximação. Se ela o fizesse, ficava a cargo dela decidir se lhe interessava ou não a oportunidade. E era ela quem ia iniciar essa aproximação. Ele, para todos os efeitos, estava de pé ao lado dela, a observando perifericamente enquanto aguardava o momento de sair da lotação. Nada mais do que isso. Coisa que todo homem faz se perto de uma mulher atraente.

Aquela sensação de estar a ser observada pairando na fronte dela a deixou perturbada. Ela se mexia demais, olhava pra ele com olhar de súplica, querendo falar-lhe alguma coisa. Fazia que ia e não ia.

Até que resolveu dar uma demonstração gratuita de feminilidade, de mulher que não resiste a uma abordagem masculina bem construída, mas que é honesta e que sua honestidade e respeito para com o seu sobrepõem qualquer tentação. Fez aparecer para ele a aliança no dedo anular da mão esquerda, que jazia sob um anel com pingente e parecia fundida a este. Mordiscava ela os lábios enquanto fazia isso. E olhava para seu reflexo no vidro da janela lhe frontal do ônibus. Ele observou a agitação dela e também o lindo relógio analógico que ela usava. Ela imaginou que lá vinha a velha e ridícula cantada de perguntar a hora.

ELE SORRINDO PRA ELA: Só pessoas de extremo bom gosto é que usaria um relógio desses. Que bom que elas ainda existem. Desculpe eu atrapalhar seu sossego, mas é que você me ajudou a decidir voltar a trabalhar com vendas desses artigos.

ELA PRA ELE: Volte sem medo, pois, eu te compraria o que vendesse.

Ele se deu por satisfeito por desestabilizá-la e cumprir o objetivo de lhe mudar o comportamento de quem apenas se interessava em aguardar um ônibus para um favorável a ele. Se estivesse em uma missão de venda ele teria vendido um exemplar do seu produto. Isso lhe incentivou a apostar no ramo. A liberou, então, da sedução hipnótica que ele provocava nela e saltou na próxima parada.

A técnica de influência a distância que ele usou ensinarei no livro que decorrerá deste blog.

Originalmente postado no blog “Voa o tempo, amor”.

Encontro marcado pela internet

A onda agora é sair para encontrar alguém que se conhece apenas virtualmente. Alguém que até o momento derradeiro é apenas uma ideia de uma pessoa colocada na mente de outra por meio de imagens e textos. Nada seguro. Nem quando rola uma webcam para deixar as cartas sobre a mesa, pois, aquele ou aquela que aparece na tela pode ser só o ou a cúmplice de um trato onde um fala e outro escreve. E assim proceder até a hora do encontro real, que inevitavelmente desvenda tudo. E este do conto aconteceu logo, sem perder muito tempo com conexões longas e diárias. Apenas três semanas se passaram, desde que se conheceram por intermédio involuntário de uma amiga em comum.

Encontraram em um barzinho próximo ao zoológico da cidade. Ela pareceu a ele mais interessante do que o que conhecera até aquela hora. Ele pareceu a ela o sujeito que fez valer a aposta. E partiram para o desafio dos primeiros instantes a conversar ao vivo, de perto. Sentindo o cheiro do outro. Que junto com o tato e o paladar era um dos sentidos que faltavam. O homem ainda tem que melhorar e muito com suas invencionices que buscam suplantar os problemas da vida atual. Encontros presenciais sem complexos, por exemplo.

As perguntas corriqueiras de primeira vez a sair juntos foram dispensadas, pois, estas já haviam sido respondidas via inbox de uma rede social. Uma ou outra coisa foi confirmada. E como não mentiram em nada, foi melhor aproveitar o momento para tecerem assuntos mais envolventes e adaptados ao instante. Torcia ela para que ele fosse ao vivo tão inovador em matéria de assuntos quanto era virtualmente, quando tem à disposição ferramentas como o Google Search para ajudar a compor uma cantada por exemplo.

ELE INICIANDO A CONVERSA: Fiquei admirado, pois você me parece bem diferente do que o que eu vejo pela câmera.

ELA: Melhor ou pior? [risos de ambos]

ELE: Eu diria que estou mais feliz com o que vejo aqui e agora, mas não que eu já não estivesse feliz com o que eu esperava de encontrar.

ELA: Eu tenho a mesma opinião.

ELA DE NOVO: Eu gosto muito do que você escreve, do que compartilha, das suas opiniões.

ELE: Tenho às vezes que me policiar muito. Opinião é algo que a gente não quer abrir mão, mas que nos trai muito. Fico feliz de você me dizer isso. Mas, com certeza, o que vai valer aqui é a sua opinião.

ELA: Tipo… a escolha do que vamos beber ou comer será minha? [risos dos dois]

ELE: Qualquer decisão por aqui será sua.

E foi parar na mesa dos dois um magnífico jantar regado a bebidas convencionais e bebidas inusitadas. O tempo passou tão devagar quanto devagar era o ritmo da música ambiente que vinha de pequenas caixas de som penduradas em cada pilastra de madeira que segurava o telhado colonial da grande área onde ficavam as mesas daquele restaurante especializado em servir comida mineira. A música foi o melhor paliativo para ele por lenha na conversa dos dois e enaltecer a beleza madura da elegante ruiva vestida para o que viesse. E o que de melhor podia surgir, surgiu. Naturalmente. Não ali, é claro!

Originalmente postado no blog “Voa o tempo, amor“.

As maravilhas que faz uma xícara de café

Eles estavam em um salão. Era uma reunião de congraçamento. Havia terminado o treinamento de uma semana, dado por uma loja de departamentos para trinta pessoas que iam ingressar na empresa e trabalhar com vendas. Sete moças e oito rapazes, que resistiram até o último dia de treino e passaram no processo seletivo eliminatório, iam dividir as vagas. Dali em diante seriam colegas de trabalho. Cada um marcaria presença em um setor de vendas específico da empresa.

Havia uma mesa em um canto do salão e sobre ela vários comes e bebes. Salgados, componentes para montar cachorro quente, garrafas de refrigerantes e caixas de suco. As pessoas, todas bem dispostas, passavam para lá e para cá animadas e não deixavam de ir até a mesa para beliscar algum comestível, fazer um cachorro quente ou encher copos com refrigerante ou com suco.

A outra opção era sentar em uma das cadeiras dispostas nos cantos do salão, em grupos de três, quatro ou cinco cadeiras, e formar um grupinho para conversar sobre como foi o curso ou sobre como serão os dias no novo emprego. A alegria no espaço contagiava quem entrasse nele.

Ele estava próximo a uma máquina cafeteira que havia no local. Pensava em degustar mais um pouco do líquido que só estava presente na celebração porque o salão reservado para ela, nos horários de intervalos dos funcionários efetivos funcionava como área para recreação e lanches. Mas, não foi só Ele a ter se interessado em bebê-lo.

Nessa vez que foi até a máquina para preparar para si mais uma dose de café expresso, ele observou ao redor para ver se alguém jazia com xícara vazia na mão. E seus olhos encontraram Ela, sentada sozinha em um canto, com ar sublime e uma xícara pendendo em uma de suas mãos, como se existisse uma leve preguiça de levá-la até a mesa.

Logo ela, que o rapaz achou bastante interessante de se conhecer em um momento extra curso, fora das aulas que estavam tendo. Ele, em vez de preparar só uma dose, preparou duas. E foi para a direção dela.

ELE: Observei que você está segurando uma xícara vazia, imaginei, enquanto eu enchia uma para mim, que você pudesse querer mais um pouco. Aqui está! Se não era isso, não precisa aceitar, eu gosto muito de café! [disse risonho o rapaz]

ELA: Imagine! Claro que aceito! Sente-se aí, eu acabei ficando sozinha nesse canto. Obrigada pelo café!

ELE: Não há de quê! Sei que faria o mesmo por mim!

E os assuntos que os dois levaram, até certo ponto rondaram o que aconteceu no curso. E depois aconteceram daquelas descobertas de coisas em comum que sempre rolam de acontecer quando duas pessoas comunicativas se apegam num canto para conversar. E disso iniciou-se um relacionamento que ficou para ser desenvolvido no novo ambiente de trabalho de ambos.

Originalmente postado no blog “Voa o tempo, amor“.

Começando bem

Tudo indicava que ele ia se dar bem naquele novo emprego. Os especialistas do departamento pessoal da loja de departamentos acharam que ele seria bem aproveitado no setor de vendas de calçados feminino. Ele passava a impressão de que tinha carisma com as mulheres. Elas poderiam entrar no setor só para falar com ele e numa dessas, se ele fosse mesmo bom, arrancaria delas no mínimo uma venda básica. E ele também sairia ganhando, pois, o cargo era comissionado e a empresa íntegra com os pagamentos de cumprimento de metas.

Em seu primeiro dia de trabalho, lá estava ele aguardando a entrada de freguesas. Vestia o traje social de vendedor da loja. No bolso da camisa, bem no lado do coração, uma caneta foi deixada juntamente com um porta cartões contendo cerca de 25 unidades. A loja mandou preparar os cartões com seu nome durante a semana que intercalou o fim do treinamento e a estréia no trabalho. A semana dedicada aos processos de admissão.

Eis que, quase uma hora de espera, pois era um dia de semana, uma segunda-feira, duas mulheres balzaquianas invadiram o setor de calçados femininos para conhecer as promoções que estavam vigorando. Ele nem cogitou ir até lá para perguntar “posso ajudar”. De antemão ele já sabia que isso está entre as coisas que vendedores afoitos fazem e que cliente nenhum gosta de ser alvo dela.

Mas, o treinamento exigia que ele o fizesse. Ele relutava quanto a arcar com a abordagem clássica, mas sabia que precisava usar sua criatividade para abordar as freguesas. Transformou sua entrada de vendedor de sapatos querendo realizar uma venda em uma entrada de conquistador de mulheres bem sucedido. Sem esquecer de seu lema: “hoje o tempo voa”, logo, nada de perder tempo.

ELE: Bom dia! – Disse seu nome para se apresentar – Sou vendedor aqui desta seção e estou à disposição de vocês, mas não quero incomodá-las. Quero que fiquem à vontade e com o meu cartão. – tirou do bolso seu porta cartão, já abrindo a minúscula caixa – Se precisarem de alguma coisa é só levá-lo até mim. Se desejarem fazer isso noutra hora, é só levá-lo com vocês!

As madames ficaram surpresas com a abordagem. Se sentiram pressionadas a levar o cartão até ele. E nem era porque haviam decidido realizar uma compra. Mas a compra foi feita.

Originalmente postado no blog “Voa o tempo, amor“.

Trabalho divertido

Novo texto migrado de um blog de minha autoria.

A administração do resort praieiro avaliou os resultados que Ele apresentava prestando serviços de garçom e resolveu explorar isso em outras áreas dentro do hotel. Tinha em mente adaptar sua serventia combinando os serviços de atendimento à mesa com os de um relações públicas. A ideia era que ele se misturasse com os fregueses em determinado momento após acomodá-los ao ambiente recreativo do restaurante, tendo substituída a tarefa de garçom por outro profissional do ramo, se possível igualmente capacitado para atender e entreter. Isso desde que os fregueses o quisessem. E nisso, ele abordaria a clientela a incentivando a solicitar petiscos e bebidas exóticas que a casa servia, divulgaria os eventos promovidos pelo resort, arrancando o interesse dos clientes em presenciá-los, e formaria, com isso, um adicional de receita bem prodigioso.

A primeira missão estava em curso. Ele tratou de conduzir turmas diferentes para mesas próximas, sem que estas se dessem conta de que ele queria uni-las. E foi o responsável por levar os pedidos e trazer, junto com um companheiro, as bandejas com os consomes solicitados. Um dos retornos dele às mesas não teve volta para a cozinha, só a do companheiro. Ele fez o combinado, se misturou aos clientes, primeiramente os induzindo simpaticamente a observar alguns truques de malabares feito com garrafas de champanha fechadas. O risco de elas caírem, se quebrarem e jorrarem o líquido para toda parte havia, mas, a plateia, não sabendo do improviso e imaginando ser um truque controlado, nem notou essa particularidade.

Enquanto ele jogava garrafas para o alto e as pegava de volta, esbanjando confiança, Ela, que estava em uma das turmas, admirava a façanha. Não a de tocar o número até certo ponto simplório, mas, por cativar a audiência, que, a bem da verdade, estava ali para ser observada e não o contrário. E ela o ouvia falar, olhando focado para as garrafas que subiam e desciam, enquanto operava.

ELE: A vida é cheia de surpresas. Vocês concordam?

A PLATEIA: SIM!

ELE: E cheia de altos e baixos. Essas garrafas podem muito bem ser um de nós! E aquele que serve pode ser servido; o que admira pode ser admirado. Basta termos carisma. E vocês têm. É por isso que eu estou os servindo e eu estou admirado com vocês. Vamos brindar! O que acham que combina com esse clima que estamos experimentando neste momento? A casa tem tanta coisa exótica, que são exclusividade dela. Querem experimentar?

E a audiência toda envolveu-se no show inesperado e provou dos demais diferenciais do resort. A tarde passou bem divertida e o turno virou sem que o tempo passasse depressa e sem que fosse percebida a virada. Ele terminou o expediente na companhia Dela. Foi quando as garrafas de champanha foram abertas, mesmo com a bebida estando quente, e um grupo de boêmios seguiu em direção à praia para admirar o luar, que até então só admirava.

O livro “Contos de Verão: A casa da fantasia” conta a história de uma pousada que arriscou competir no mercado hoteleiro em um paraíso tropical cheio de tubarões do empreendedorismo, apostando em inovações no atendimento e no talento de cada funcionário, não interessando a rudimentarização da sua função.

Ele esteve estudando ela

Continuando a migração de postagens de outro blog de minha autoria que faço por aqui.

Não é verdade que as mulheres são interesseiras e que elas preferem os sujeitos ricos com os seus carrões disponíveis para levá-las aos mais mirabolantes lugares. É verdade que esses sujeitos pensam assim e plantaram esse pensamento na mente das pessoas. Isso durante longos anos de doutrinação. E agora que todos aceitam essas ideias, eles se sentem confiantes em qualquer abordagem, pois possuem um passaporte que cuida de tudo por eles, que são seus pertences e a boa situação financeira propagada como a desejada pelas mulheres para terem os homens que as quiserem conquistar.

Mas, tem gente que não conta com esse passaporte e ainda assim goza de muito boa adesão junto às mulheres. Com eles elas vão aonde puderem ir, com ou sem condução própria, e se divertem de maneira inesquecível, sem dever nada para a outra opção de companhia que são os playboys ricaços.

O que faz com que esses módicos galanteadores atinjam objetivos tão sublimes dada a sua condição social? Simples: Eles ignoram o fator propaganda, ou às falácias, ou à cultura de estratégia que quem quer levar vantagem sobre eles implanta. Eles se recusam a aceitar que o que leva as pessoas a se entregarem a amazeios para o fim de se divertir sejam coisas tão finitas, artificiais e fúteis. Eles apostam na forma de abordar como acumulador de pontos, no despertar de interesse baseado na magia do encanto e da simpatia. Eles acreditam no chamado da natureza, que é aquele instinto que bate nas pessoas quando são abordadas por outras que as deixam incapazes de resistir ao que propõe o outro.

Na sala de aula da faculdade de turismo, a mocinha mais linda era disputada pelos solteirões e até pelos que mantinham algum compromisso. Isto, sim, era motivo de desinteresse para ela: já possuir um compromisso. Os caras mais endinheirados, que não precisavam trabalhar durante o dia para manter o próprio sustento e tinham o tempo livre só para estudar e flertar, sentiam-se bem à vontade para trazê-la para o grupo deles. Os menos endinheirados estabeleciam, eles próprios, limites para si e ficavam naquela de amor platônico: degustar do doce só na imaginação por não ter muita chance de prová-lo na língua.

Exceto Ele. Ele, primeiramente, não criou o interesse por ela baseando no fato de ser ela a garota mais linda e cobiçada da sala. Ele deixou que o interesse aparecesse naturalmente. É o primeiro fator que leva as pessoas umas às outras. E Ele não entraria em nenhuma disputa para conquistá-la. Ele sabe que o que é dele ele não precisa disputar, pois chega até ele. E com essa convicção ele estava sempre a passar na frente dela para lá e para cá e, sem querer fazê-lo, demonstrando sua dedicação pelos estudos, já que estavam numa faculdade, e sugerindo ser só o que lhe importava durante o tempo que gastava naquele lugar. Ela, intuitivamente, percebia essas particularidades dele. Emanava dele e chegava a ela como um gelo que ela se sentia tentada a quebrar, como um mistério que ela precisava desvendar, como uma tormenta. Ela sabia que não estava a ser rejeitada, mas sentia aquilo como se fosse uma rejeição. E rejeição não tem quem suporte sem fazer nada para mudar de figura.

ELA PARA ELE: O professor disse que vai passar um trabalho em grupo pra gente fazer. Posso formar a dupla com você?

ELE: Claro! De repente é uma oportunidade para a gente se conhecer mais do que o que nos conhecemos como colegas de escola.

ELA, SURPRESA: Eu… não sei se vou poder ajudar muito… já deve ter percebido que tenho muita dificuldade nessa matéria!

ELE, SEGURO: Essas dificuldades acabam quando a gente encontra um motivo para passar por elas. Se você aceita formar dupla comigo, eu creio que já achei o meu motivo.

A fala dele a deixou imobilizada. Ela se sentiu útil, valorizada e não como a ser observada apenas como uma decoração da sala de aula onde estudava. E por isso eles iniciaram um namoro.

Conquistando e fazendo compras

Mais um texto tirado de um blog que tenho no Blogger.

Ele a viu logo que entrou no supermercado. O fato aconteceu enquanto ele pegava um carrinho para colocar suas compras. Não deu para saber se ela era casada, se tinha alguém, se gostava mesmo era de homens. Dos maduros ou dos mocinhos. O que importava para ele era obter essas respostas, por isso, meio que a parecer para ela encontros por coincidência, em todo corredor que ela passava ela se deparava com ele. Na imaginação dela eram ocasionais os encontros, mas ele fazia por onde acontecerem.

E usava ele uma técnica muito empregada em hipnose neurolinguística chamada espelhamento. Tudo que a moça tirava da prateleira e colocava em seu carrinho ele tirava também e punha no dele. Da mesma marca de produto, por sinal, e tal. Só poupava na quantidade do produto, para sugerir, caso ela estivesse mesmo o reparando, que se tratava de um homem que mora sozinho e que fazia a sua dispensa.

A técnica do espelhamento visa fazer com que uma pessoa sinta familiaridade com outra, ainda que não conheça esta. Isso causa o que, também em neurolinguística, é chamado de raporte. Que é o mesmo que empatia ou despertar de interesse. O mesmo que envolvimento.

Eis que à distância, a parecer deslocar-se naturalmente por entre os corredores e gondolas, ele viu o sinal amarelar-se e desacelerou-se. Ela entrou em uma seção onde só havia produtos exclusivamente femininos. Talvez ela estivesse sendo estratégica e querendo pegá-lo. Talvez, como era óbvio, ela quisesse apenas completar sua lista com os materiais que lhes eram próprios. Se ele também colocasse no carrinho que puxava um pacote de absorventes, ela, no mínimo, pensaria que ele comprava isso para a esposa.

Mas, para ele, as situações adversas soam como oportunidades para colocar o instinto criativo em ação e aparecer com alguma inovação. Quantos enferrujados homens de negócio gostariam de ter à sua disposição essa particularidade de alguém? E, como Henry Ford, ele pensava: “Obstáculos são o que a gente vê quando tira os olhos do foco”. E lá foi ele com o seu carrinho para perto dela.

ELA: Vai comprar um pacote para a sua namorada? Quer que eu te ajude a escolher?

ELE: Eu adoraria, mas, por não ter namorada terei que dispensar a ajuda. Sinto amargamente! [risos]

ELA: Desculpe eu ter te feito a pergunta, mas, é que a gente trombou por quase todos os corredores e parece que temos os mesmos gostos… [ela falou sorrateiramente]

ELE: Eu também notei isso. Para mim soa como um sinal. Então, tomei a precaução de já saber um pouco mais sobre os seus gostos quanto a produtos exclusivamente femininos. Quem sabe um dia você pode aparecer na minha casa e… não quero estar desprevenido. Vou querer ter em meu poder tudo o que você precisar. E exatamente do jeito que você acha melhor.

Sabe quando uma pessoa olha para outra e pensa “cara de pau”, “mas bem que me pareceu bem interessante o danado”? Foi o que passou na cabeça dela enquanto eles riam da cena ao mesmo tempo que tiravam pacotes da prateleira do supermercado. E durou algum tempo esse clima até que, já assumindo ele o encontro em vez de fazer parecer casualidade, juntos eles seguiram para o mesmo caixa, pagaram o que compraram e trocaram números de telefones para combinar de degustarem na casa dele, um dia após um programa antecedente que ocorresse em um local mais formal, as iscas de melusa que ele colocara em seu carrinho junto com uma boa garrafa de vinho, logo quando decidiu que iria tentar abordá-la.

Se você põe em prática um evento final para uma situação que pretende iniciar, mais chances ela terá de ocorrer, pois o fator principal já está consagrado: a confiança em si. Primeiro existe na mente para depois existir na realidade. Assim no céu, como na Terra.

Enquanto amando estamos curados

O clima do verão fazia suas vítimas, contaminando-as com a felicidade típica dos finais de tarde dessa estação. A turma estava na praia, tocando em frente um luau. Doze a quinze pessoas em sistema de revezamento de idas ao mar e buscas nas barracas da praia de mais comes e bebes. Havia os permanentes incondicionais, que não arredavam os pés do QG. Estes não abriam mão de cantar e dançar, se possível, qualquer coisa que os musicistas improvisados iniciavam os acordes que iam paulatinamente sendo reconhecidos e ganhava força o vocal.

Entre corpos sarados de homens e mulheres, uma mulher branca, beirando a meia idade, muito acabada e careca, se esforçava o máximo para manter-se no clima alegre e revigorante, que se não fossem as preocupações lhe programada pelos médicos, a faria imaginar que estava sendo desenganada sem motivos. O tumor em seu cérebro talvez fosse mentira. Mentira da mente do neurocirurgião, mentira do tomógrafo. Nenhum glioma residia em seu cérebro.

Foi uma descontração perniciosa que lhe tirou do transe em que se colocara. O rapaz que administrava muito bem o pessoal com uso de seu instrumento, um violão, fizera com que as pessoas tocassem no assunto que ela preferia esquecer. E ela mesma achava que era nada demais o refrão “e se for de amor, quero morrer agora“. Soou como mau gosto sem ele ter a menor das intenções de fazê-lo. Uma canção que ela própria muito gostava de ouvir.

A emoção da gente é um sentido. E ele se assemelha ao tato quando nos empurra incontinentemente as lágrimas para fora. Ao comando de seu pensamento viajante, que visita lugares mórbidos sem que ela queira, isso aconteceu com a moribunda. A cena da jovem senhora tentando disfarçar o pranto e tentando deixar o local sob desculpa sem nexo, fez com que houvesse uma brusca interrupção no evento. As mulheres da trupe confortaram a doente. O violeiro se pôs a redimir-se. E buscou em sua mente algo para compensar. Alguma cancão que carregasse uma mensagem de esperança.

Existirá / E toda raça então experimentará / Para todo mal a cura“. Ao fim da última estrofe da linda música do Lulu Santos, a até esse momento triste e inconformada senhora foi abraçada em grupo. O violeiro pediu um abraço em separado. As coisas voltaram ao normal. Ficaram até melhores. Alguém registrava em vídeo tudo o que acontecia, com uso de seu smartphone.

O evento aconteceu durante uma viagem de férias da protagonista deste conto. Fora para ele pensando que poderia ser a última vez que faria o que mais gostava: viajar. Voltou para casa fazendo planos para conhecer em breve outras praias. O convite partiu da turma com quem conviveu naqueles quinze últimos dias de janeiro.

Ela se relaxou um pouco com as recomendações médicas em seu cometimento de férias. E trouxe o vício com ela na sua volta para casa. Por mais de uma semana deixou para lá os remédios. Comia o que desse vontade. Agindo assim e vez ou outra relembrando os momentos vividos no litoral nordeste do Brasil, Ela conseguia acreditar que estava curada. Ela se comportava assim. Tomava cuidado para que ninguém da sua relação lhe dissesse o contrário e novamente programasse sua mente com a sugestão da doença. A maldita sugestão que alimentava somaticamente o seu câncer.

Se os filhos e o restante da família se ocupassem de lhe dar mimos, compreensão e um pouco de ilusão, as dicas de alimentação lhe dadas por um homeopata que ela conhecera em uma de suas idas ao hospital seriam suficientes para que aos poucos, com a ajuda do otimismo a que se configurara com ele estando no Norte, as células de seu corpo detivessem a degeneração.

Ela fugiu de tudo o quanto pode. A família não contribuiu para a cura alternativa nem com ela fazendo o pedido. E, usando de artifícios irrefutáveis, convenceram-na de ir ao consultório de seu médico fazer o exame de rotina. Nem que fosse pela última vez. Ela, por sua vez, quis provar para seus entes familiares que voltaria de lá com uma notícia que os surpreenderia e ela não mais retornaria àquele gélido estabelecimento.

Um médico não gosta de perder pacientes. Realmente não. Mas, fica-se sempre a dúvida quanto ao ponto de vista que se deve validar essa perda. O ceticismo digno da profissão, herdado dos centros de formação, fez com que o neurologista dissesse com ar descrente à pobre mulher que a doença parecia ter sofrido melhora, mas que não era bom se precipitar e parar com o tratamento. Um acompanhamento dele a deixaria mais tranquila para se chegar à certezas. E, como profissional convicto do ramo e da escola que teve, pediu encarecidamente à mulher que se livrasse dos homeopáticos, não seriam eles os responsáveis por qualquer mudança no curso da doença.

A jornada combinada com a turma da praia aconteceria em julho. Mês oposto ao de janeiro. Com frio e busca pelo campo em vez do litoral. Durante o tempo que teve ainda de vida ela trocou correspondência com todos eles. Inventaram até um cronômetro que marcava uma contagem regressiva e uma agenda para ticar os eventos precedentes ao novo passeio.

Ela venceu o câncer. O que a levou não foi esse mal. A falta de amor, de compreensão, de amizade e a autossabotagem, que faz com que deixemos de fazer o que queremos para fazer o que querem os outros, deteriora-nos internamente muito mais. Os outros animais nunca sabem quando estão doentes e simplesmente vivem. Era assim que ela pretendia viver o resto de sua vida, que ela sabia, não era o médico que lhe determinaria.