Depois da missão cumprida

Assisti o vídeo de despedida do Fusca, produzido pela agência Johannes, a pedido da Volkswagen, e veiculado nos Estados Unidos.

A animação ao estilo Andy Warhol possui apelo emocionante e fecha com uma apoteótica ascensão do Fusca ao reino de onde veio, o da imaginação, tendo “Let it be” dos Beatles tocando ao fundo.

Com todos nós acontece o mesmo com o advento da morte: voltamos ao reino onde todas as coisas são imaginadas. O reino da criação.

Lá está o eu superior de cada um de nós, que é a consciência por trás da nossa observação e da nossa mente. Ela faz parte de uma consciência maior, que concebe tudo o que há no universo que desfrutamos e se divide em consciências individuais para o fim de usufruir, observar, captar sensações provocadas pela sua própria concepção.

Deve ser qualquer coisa surrealíssima essa situação de existência, na qual se coexiste diretamente com seres e objetos de todos os tempos. Tempos que já se foram e que estão por vir. Idem os objetos.

Um paraíso onde os viventes nele desfilam em formas diversas, incluindo a de inteligência ou energia pura. Em cores, sabores, cheiros, texturas e melodias oníricas, espirituais. Sem qualquer dependência temporal ou espacial. Onde tudo é flúidico, a nitidez não é importante e os limites da física são extrapolados.

Tudo é presença nesse lugar, vamos assim dizer. E é possível uma presença definida como a de um ser humano atravessar uma parede e seguir seu curso. Voar a altura impressionante e rumar em queda livre a um mar de rochas.

É isso o que nos espera após a morte. E por causa disso, em vez de aflição e medo do pós-morte deveríamos sentir é anseio. Lutar, é claro, o mais que puder para se manter vivo o máximo de anos aqui na Terra. Mas, dar de mão completamente de toda programação mental que recebemos sobre a morte e que nos faz viver mais limitados do que já nascemos predestinados a ser.

Eu preferiria não nascer

Terravistadealphacentauri

A maioria das pessoas cresce alimentando a ideia de um dia se tornar famoso, ser conhecido de muita gente, bem sucedido, admirado, influente. Rico e poderoso poderia estar entre as aspirações.

Mas, essa maioria acaba é fazendo com que os poucos que conseguem tudo isso tenham êxito. Ou seja: a maioria de nós vira contribuinte, patrocinador dos sonhos de outros, mero sonhador.

E isso, para esses dessa maioria, acaba, lá pelos cinquenta anos de idade, virando frustração, decepção, sensação de fracasso e de ter perdido tempo ou de não ter se empenhado o bastante e por isso não cumpriu o suposto objetivo da vida e outros  arrependimentos.

Só que tudo o que nos inspira a ter ou a ser para podermos dizer que fizemos valer nossa existência foi produzido pelo homem. Nada é natural e nada é deveras importante ter ou ser.

Fazer valer a própria existência é aproveitar cada momento fazendo o que se quer, tendo liberdade de fazer o que quiser, guardando para isso a qualidade de ser natural, vindo da natureza à mente o que fazer. Mesmo que coisa que aos olhos do propagado como “o destaque” seja coisa taxada como pequena, que está ao alcance de qualquer um fazer.

A Terra vista de Alpha Centauri, por exemplo, parece um grão de areia. Cada um de nós, então, não há sequer medida que conhecemos para comparar. Quem de lá nos enxerga, mesmo que um humano com as mesmas proporções de um humano médio, não consegue dar valor à qualquer coisa magnânima que possamos ter feito. Nada do que fazemos ou fizemos é percepitível lá por aquelas bandas. Todos nós, até mesmo o que se acha melhor do que todo o mundo, somos um nada sem importância para uma consciência que nos observar até mesmo de distância menor do que a que se encontra o sistema estelar mencionado.

E o nosso tempo? É brincadeira! Cada dia terrestre significa uma volta da Terra sobre si mesma. O que chamamos de cansativas 24 horas que gastamos trabalhando, estudando ou se ocupando com coisas medíocres, como por exemplo o futebol, não se poderia medir sequer nos desprezíveis nanosegundos que utilizamos para informar o quão rápido gira um processador de computador. Uma vida de longos anos de um velhinho passa para quem de lá nos vê com uma rapidez que parece que nem existimos.

O que é cada conquista humana perante isso? Cada orgulho e cada humilhação? Momentos de alegria e de dor? Comemoração por ter atingido o sucesso ou frustração por só se vir fracassado?

Nada. Exatamente nada. Com tanto dinheiro que se pode ter conseguido na vida, se a sua vida foi pelejar para acumular esse dinheiro ela não valeu de nada. Todo o tempo gasto contribuindo para o sucesso dos outros em vez do próprio idem. É melhor fazermos mais por nós mesmos nos mantendo iguais e fazendo um pelo outro o melhor possível para tornar esta existência coletiva que estamos nela válida para todos nós. O próprio planeta agradecerá por termos tomado essa iniciativa. O que chamamos de Deus idem.

Não perder tempo com coisas fúteis, com os nossos costumes torpes, com disputas, com atritos ou mesmo com celebrações sem nexo é crucial para se vir cumprindo, deverasmente, o objetivo da vida.

Já pensou se tivéssemos a chance de escolher virmos ou não a essa existência? Quantos de nós, de repente, preferiria sequer ter nascido? Pra que valorizar tanto a vida com base nos interesses que nos impregnaram na mente, se os mesmos diante a uma conscientização legítima do nosso papel e da nossa posição no Universo não passam de mero lapso de tempo mal aproveitado?

Pronto para morrer: I have found what i looking for

palidopontoazul

Eu descobri que a vida não passa de ser a atenção que damos a um ponto. Do foco que mantemos a uma cena e os elementos dela com os quais interagimos.

O que está na cena que focamos, participando dela junto conosco, se comporta como partículas para nós. O que estiver fora dela, incluindo o que está às nossas costas, se comporta como energia pura. Ou seja, podemos até vê-los, mas, não têm qualquer significado pra gente, a não ser que entrem no nosso palco e passem a participar da peça.

Eu consigo me por no espaço sideral, a milhões de anos luz de distância, e desse ponto quando olho para a Terra eu a tenho que procurar em meio a nebulosas de pó. Se eu conseguir identificá-la, por certo eu só sei que algo acontece dentro do grão de areia que ela me parecerá porque um dia eu já estive dentro dele.

Se eu decidir, de lá de onde eu estiver, avançar até meu planeta natal, à medida que me aproximo dele é que as coisas ganham importância. Vão sendo definidas, ganham limites e individualizam-se. De forma que em determinado momento o close será tão fechado que eu passarei a pensar que eu não saí de onde eu estava e que a Terra pode ser um dos pontos repletos de microorganismos que eu estarei a enxergar.

E olhe isto: Se eu olhar para a minha mão e puder penetrá-la com a minha visão, eu estarei fazendo essa mesma viagem em direção ao infinito novamente. Se eu conseguir atingir o plano em que se encontram os átomos, mais além até, então, eu estarei a ver a energia pura. Nada mais haverá para ver ou o sentido da visão não será mais capaz de observar o que vem depois.

E se eu estiver ainda a milhões de anos-luz de distância da Terra, e fitar a minha mão com a mesma intensidade ocular, eu terei a mesma experiência que teria se eu estivesse dentro da Terra fazendo a mesma coisa. Eu teria levado comigo aquele universo que pertence à minha mão. E o fim dele é sempre, provavelmente, o inicio ou o retorno ao universo em que materialmente minha mão estiver inserido. O qual está inserido no todo de pura energia que vagueia formando coisas versáteis, das quais somos uma delas, desde a origem de tudo, desde o Big Bang, que de repente também é continuo e continua a explodir.

Então, o que estou fazendo comigo levando a vida que levo? Insatisfeito com ter que trabalhar todos os dias, o dia todo; com algo que eu não gosto de fazer; gastando com a minha locomoção até o local de trabalho o tempo que eu gostaria de gastar escrevendo, por exemplo. Tendo sonhos que só são adiados e que eu não sei se antes de morrer eu terei os realizado.

E se realizados, qual o impacto que isso vai ter sobre mim em vida, que não um instante de alegria seguido de tédio e vontade de realizar outra coisa? Será que depois de morrer vou levar essa alegria comigo? Poderei usá-la? Vou saber ou querer fazer isso?

Não serão estas, coisas orgânicas, típicas da vida biológica ou da vida que levamos na Terra? Ou seja: vai servir para outros lugares onde provavelmente eu não serei um ente material e sim espiritual, já que terei desencarnado e viverei como espírito? Como pura energia. Será que só um corpo físico contendo um cérebro humano pode captar essas sensações? Teriam os espíritos outros canais de receber os impulsos desse evento e a ocasião gere sensações bem diferentes do que experimentamos materialmente?

Seria o máximo que essa vida poderia me legar estando eu num estado espiritual: recordações de momentos alegres. A alegria é uma sensação. É abstrata. E as coisas abstratas são etéreas, espirituais. Pode ser que vá ter algum valor pelo lado de lá.

Então, se sou um nada para um observador distante enquanto vivo uma vida insípida aqui nesta existência; e se após partir desta eu serei algo maior e levado para qualquer lugar do cosmos, talvez do cosmos de outro plano, onde haja outras dimensões e sentidos; e se só as alegrias que eu vier a experimentar por aqui é que pode ser que irão ter algum significado para mim. Por que perco tempo suportando essa vida de insatisfação e agonia?

Eu estou pronto para morrer, pois, encontrei a resposta do que eu procurava. Entretanto, morrer só vai ser fácil se advir-me naturalmente. Logo, até que isso me venha, que eu abandone a minha insegurança e a minha covardia e dê um basta nos limites a que estou preso. Ainda que isso signifique que eu vá virar um desagregado da sociedade, um vagabundo, um mendigo, um ermitão, um monge. Qualquer coisa que me faça sentir liberdade. Que me faça viver sem horários para cumprir ou contas para pagar ou satisfações para dar.

Meus sonhos acabaram

Meus sonhos se foram.
Sem que eu os tivesse realizado.
Mas, a vida continua.

Eu… entrei nessa de me libertar de crenças.
E nada mais faz sentido para mim.
Nada mais me traz inspiração ou me feticha.

Eu não quero ouvir falar sobre nada mais.
Eu não quero presenciar nada mais.
Eu não quero escrever sobre nada mais.
Não quero iludir com nada mais os poucos que me lêem.

Se não possuo mais crenças, com o que poderei eu iludir alguém?
Sobre o que escreverei, se só escrevemos sobre o que acreditamos ou com o que sonhamos?

Há o tempo de plantar e o tempo de colher.
Há o tempo de nascer e o de morrer.
Entre os dois tempos há o tempo de viver.

Eu gastei muito tempo escrevendo e sonhando porque eu achava que eu estava vivendo.

Eu gastei muito tempo tocando canções e desejando ser notado porque eu achava que eu estaria vivendo.

Gastei muito tempo desenhando, pintando, imaginando projetos infalíveis de sucesso, desenvolvendo programas de computador.

Deus me encheu de dons, mas eu só falhei com eles.

O único dom que eu obtive êxito foi o de persistir. Foi o da iniciativa. Eu nunca quis morrer sem tentar. Agora já tentei tudo e estou sossegado. Minha missão foi cumprida.

Talvez eu não tenha falhado em nada. Talvez eu tenha criado a expectativa errada.

Talvez o resultado que as pessoas tinham para mim é o que elas me deram.

Talvez eu nunca fui de confiança, Talvez eu não tenha dado nada para elas como eu achava que tinha para dar.

Sou grato àquele que me ensinou o que é perder as crenças e me estimulou a procurar por isso.

Esse jeito cético é o que me faz bem hoje. Viver sem crença; viver sem esperança; viver sem esperar cooperação das pessoas. Tudo isso é maravilhoso.

Se eu escrever mais, escreverei pra mim; Se eu tocar mais canções, tocarei para mim;
Se eu desenhar qualquer coisa, será para mim.

E assim, prosseguirei feliz.
Como um poeta morto.
Ou um violeiro estulto.
Ou um pintor inadequado.
Um alguém na multidão que encontrou a razão e enxerga nitidamente a realidade.

E não espera nada dela.