Por que não acredito em Deus?

Conversávamos em uma mesa do refeitório. Eu, um amigo e uma amiga. A gente falava sobre como a mídia tem o poder de moldar a opinião das pessoas. Eu precisei de um exemplo para expressar o porquê de eu pensar que não adianta a gente achar que temos uma opinião formada, pois, se nos expomos à mídia, a mais robusta das nossas determinações pode ser alterada.

O que fez a gente chegar a esse ponto foi eu dizer que existem homossexuais que são naturais, aqueles que em qualquer momento da vida deles seu interesse pelo sexo oposto não ocorreu, e os que são engenhados, os que recebem programação mental de veículos externos e alteram sua opção sexual por sofrer influência, modismo e outros mecanismos empregados pela mídia em geral, incluindo aqui até mesmo a escola e o uso da tecnologia. Sim, o celular é hoje um dos principais influenciadores da homossexualidade. Basta ter um e entrar em uma rede social e começar a receber seguidores e sugestões que se está propenso a acreditar que esteve dentro de um armário e não sabia. Daí, o exemplo que me veio me fez falar sobre política.

Eu dizia que ainda que se tenha uma conceituação firme a respeito de certo partido e certos políticos, se estes sofrerem a aversão dos grupos que controlam a grande mídia e a faz trabalhar para eles, a chuva de informações rechaçando a imagem destes, se estivermos expostos a ela iremos nos molhar nela e sua enxurrada irá nos carregar para onde ela quiser. Dei o exemplo de um amigo rico que era lulista, quando deveria ser o contrário por ele ser rico, votou na Dilma em seu primeiro mandato, votou para o segundo e sofreu a lobotomia operada pela mídia a partir de 2015 e hoje ele acredita em tudo que ficou estabelecido para colocar o Lula na cadeia e destruir a imagem do Partido dos Trabalhadores.

Bem, entrar no assunto Política me pareceu uma boa ideia para o meu intento, mas, acabou foi seduzindo os interlocutores a falar disso. E meus amigos não admitiam que acreditavam em algo por influência dos outros. Quando eu disse que eu duvidava dos números de intenção de votos para o Bolsonaro que publicam, um deles me disse que faz sua própria pesquisa e que ela confirma para ele as estatísticas. Conforme ele, em seu perfil de rede social, para cada três contatos que ele tem, dois deixam rastros de que irão votar no ex-militar. Os rastros ele explicou que seriam curtidas em postagens favorecendo o político mencionado, compartilhamentos de publicações positivas ao homem, comentários do mesmo tipo e publicações próprias no próprio mural, mostrando-se adepto à popularidade do Bolsonaro.

Eu disse para ele que é duvidosa a manifestação de expressão ou posicionamento nas redes sociais na internet, pois, o Facebook – a rede citada pelo rapaz – possui mecanismos que podem maquinar as opiniões das pessoas. Curtidas, comentários, compartilhamentos e até publicações podem não passar de fake. Cada um vê somente o mural do próprio perfil e o que trafega nele. Nem sempre a gente checa – e algumas vezes sequer temos como checar ou sequer sabemos se fulano em destaque é um de nossos contatos – se o que é informado como reação ou publicação de um contato nosso na rede é vero, se ele fê-lo realmente. Há marqueteiros que pagam esse trabalho ao Facebook. É uma forma da rede faturar e ser conservada como gratuíta aos usuários.

Conclui meu raciocínio dizendo que só temos como opinião ou fato indubitável aquilo que nos é apresentado pessoalmente, do jeito como estávamos os três dando declarações próprias, olhando nos olhos de cada um. Cristãos os dois amigos, eles me deram razão e completaram observando que de outra maneira só deveríamos acreditar em Deus. E aí, suspeitando que eu fosse ateu devido aos pontos de vista com conotação esquerdista, pediram para eu me posicionar quanto ao que foi evidenciado.

Aí eu perguntei: “Quando você diz ‘acreditar’, seria acreditar se Deus existe“. E eles responderam “sim“. Respondi, então, que eu não acreditava e, sim, tinha convicção da existência de Deus.

Acostumados com o que manda responder seus doutrinadores, eles vociferaram que crer e ter convicção era a mesma coisa. Não resisti dar a eles explicação sobre mais esse ponto de vista.

Peguei o celular da amiga e falei: “Nossa amiga aqui é casada. A gente sabe disso por causa da aliança que ela tem no dedo anular da mão esquerda e pelo tanto que ela menciona seu marido. Acreditamos nisso. Podemos apostar que ela tem fotos do marido no card deste celular.

Continuo fora de aspas:

Se ela nos permitir vasculharmos o aparelho em busca dessas fotos e o fizermos e nada encontrarmos, então, seremos tomados por uma grande frustração de expectativa e nossa crença vai embora. É o que vai acontecer com os que só acreditam em Deus se ele de repente aparecer. A fé vai embora e fica a plena convicção de que o ser existe. Isso é o que mais temem acontecer os líderes religiosos. Acaba com o negócio deles. Assim como acabaria se de repente eles doutrinassem os fiéis de suas igrejas a convicção em vez da crença na existência de Deus.

E de mais a mais, conforme a doutrina cristã, se Deus aparecer, que merecimento é devido ao cristão que sempre acreditou que ele existia? Fica um “confirmou, acabou“, não? Parece que a dependência dessa descoberta era só a confirmação se o que o pregador doutrinava tinha fundamento, se não se foi enganado. Ao passo que aquele que sempre teve convicção da presença de Deus permanecerá na mesma, contando com ele para o que sempre contou. Não muda nada. Isso é muito mais nobre e honesto. Mereceria de Deus quando ele surgisse um “você sempre confiou em mim, vai ter toda a minha ajuda“. Confiar é diferente de acreditar.

Voltando ao caso, eu e o amigo teríamos três atitudes a tomar, caso fôssemos decepcionados na nossa busca por uma foto do marido da nossa amiga no celular dela. Uma seria dar como desfeita a nossa crença de que a amiga era casada e a partir de então a trataríamos como uma falsária – que faz parecer ser o que não é – ou como uma desleixada com o seu casamento. Ou passaríamos a pensar que ter uma foto do marido em seu celular não é fator importante para a condição de ser uma mulher casada. Nós é que teríamos sido doutrinados com informação falsa e a levávamos adiante sem questionar. Ou continuar acreditando no que já acreditávamos, que ela era casada, porém, deixando de querer comprovar ou não o fato. Mantermo-nos na estagnação da fé, desde que manter significasse algo importante para nós.

Porém, se algum dia a amiga aparecesse perante nós com o marido, tendo nós quatro oportunidade de conversar pessoalmente, em carne e osso, o marido confirmando a informação que a esposa teria nos passado, ainda que se tratasse de um fake – o mesmo fazendo confirmações falsas e apresentando certidão de casamento idem – não teríamos por que duvidar da informação e nem precisaríamos manter a condição de só acreditar. Passaríamos a estar convictos de que a amiga era casada. Estaríamos convencidos disso, pois, teríamos recebido confirmação que desfaria qualquer dúvida. A fé nessa crença acabaria.

E ilustrado o ponto de vista com o exemplo, pontuei que com relação a acreditar em Deus eu me encontrava na situação de estar convicto de sua existência. Era indiferente para mim ele existir ou não, pois, meus processos vitais e meus afazeres não dependiam dessa resposta, portanto, eu não precisava ficar estagnado na fé e nem tampouco me preocupando o tempo todo com isso. Assim como uma mulher casada não precisa portar uma foto do marido em seu celular para confirmar seu estado civil, eu não precisava que Deus estivesse em algum lugar onde eu pudesse procurar para encontrá-lo para entender o mundo, me sentir acompanhado e recebendo auxílio em minhas decisões. Bastava para mim a convicção de que tudo isso acontece, queira eu ou não. Como uma coisa inexorável, inerente ao meu ser. O que as igrejas fazem é vender a dúvida sobre a existência de Deus e não a certeza. É essa dúvida que enche as igrejas.

Mas, se eu me expuser muito à questão, ficar procurando chifre na cabeça de cavalo, algo ou alguém pode me fazer mudar de opinião. Da mesma forma que a mídia faz mudar de opinião aqueles que se expõem à ela. E assim ficou explicado.

Essa opinião sobre a fé está presente nas páginas do livro “Contos de Verão: A casa da fantasia“.

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